terça-feira, janeiro 20, 2004

Sophia, Fiama e Unamuno



Hoje trago mar. E três poetas: Sophia de Mello Breyner Andresen, Fiama Hasse Pais Brandão e Miguel de Unamuno.

O poema de Sophia, retirado de O Búzio de Cós e outros poemas

“Beira-Mar

Mitológica luz da beira mar
A maré alta sete vezes cresce
Sete vezes decresce o seu inchar
E a métrica de um verso a determina
Crianças brincam nas ondas pequeninas
E com elas em brandíssimo espraiar
Em volutas e crinas brinca o mar”



Os poemas de Fiama, saídos de Cenas Vivas

“Rias

O caminhar pela areia sem caminho,
indo ao sabor dos recortes e marinhas.

Ao sul ou norte de um país marítimo,
era um tempo passageiro esse
do caminhar pela areia sem caminho.

Baixa se estendia a água.
Deitada no chão, a sombra era bebida
por essa água pouca, areia ávida.”


“Leituras em Novembro

O mar bate como se o sopro
do separar das águas de novo
rasgasse a terra alcantilada.
Não o vejo, mas ao longe
oiço, no êxtase, o rumor
das ondas infinitamente.
Depis calamo-nos ouvindo
a voz interior apenas e pensamos
nos livros que consubstanciam
a separação entre a terra e a água.”


“Espaços

Todas as coisas e seres
são dados aos poemas e exigem estar.
Próximas paisagens distantes,
seres presentes.
Entre o aparo e a escrita.
Próxima, não a respiração
mas a presentificação das coisas,
infindos riscos.”


“Nuvens

Nuvens mostram-nos ao longe
a ficção de serem formas cénicas.
Mesmo rostos podem nascer ali
debaixo de madeixas claras.
Risos podem rasgar-se, entre
raios de sol e sombra. Essa,
por vezes, a vida frágil dos risos.”

(os poemas acima foram pilhados daqui)


Acabando com Unamuno, retirado da sua Antología poética
(Nota - como não consigo manter a mancha gráfica original dos poemas, faço o arranjo clássico de soneto...)

“XXXIV

La mar ciñe a la noche en su regazo
y la noche a la mar; la luna, ausente;
se besan en los ojos y en la frente;
los besos dejan misterioso trazo.

Derrítense después en un abrazo,
tiritan las estrellas con ardiente
pasión de mero amor y el alma siente
que noche y mar se enredan en su lazo.

Y se baña en la oscura lejanía
de su germen eterno, de su origen,
cuando con ellas Dios amanecia,

y aunque los necios sabios leyes fijen,
ve la piedad del alma la anarquía
y que leyes no son las que nos rigen.”


“LII

Dime qué dices, mar, qué dices, dime!
Pero no me lo digas; tus cantares
son, con el coro de tus varios mares,
una voz sola que cantando gime.

Ese mero gemido nos redime
de la letra fatal y sus pesares,
bajo el oleaje de nuestros azares
el secreto secreto nos oprime.

La sinrazón de nuestra suerte abona,
calla la culpa y danos el castigo;
la vida al que nació no le perdona;

de esta enorme injusticia sé testigo,
que así mi canto con tu canto entona
y no me digas lo que no te digo.”

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