sábado, junho 12, 2004

Ninguém é profeta...


...em sua terra.
Por aqui, se vive uma febre, uma intensa febre. E essa febre tem nome: futebol. Pela primeira vez, Portugal organiza uma Eurocopa. E depois disso, fruto de uma qualificação muito suada, essa febre se vai prolongar pelas Olimpíadas.
Mas esta eurocopa está fazendo mexer este país. Não sei se por um bom ou mau motivo, mas este país está mexendo. Todo o mundo tem andando deprimido há já bastante tempo. Demasiado tempo. Na prática, desde que este governo tomou posse e o primeiro-ministro disse que o país estava de tanga. Dois anos. É muito tempo. A recessão também não ajudou e os acontecimentos internacionais ainda menos.
E chega a eurocopa. E como selecionador do time português temos Luis Felipe Scolari, Felipão. E eu, sem me ligar muito nestas coisas da bola, gosto dele. Porquê? Porque é um otimista. Eu sei que um otimista é um pessimista mal informado, mas sabe bem ouvir um discurso positivo de quando em vez. E o Felipão tem esse discurso. E esse discurso não é apenas com o time que ele treina, é com este povo, este povo português. E de repente, conseguiu que todo o mundo se sentisse um pouco mais português! Pediu uma coisa simples: "para apoiar a seleção portuguesa, pendurem bandeiras em vossas janelas". Bem, não sei se as suas palavras foram mesmo estas mas, de repente, a bandeira portuguesa virou moda!
Se vende em qualquer esquina (o pessoal - daquela seita em que são todos iguais e todos dizem o mesmo: "qué frô? qué frô?" - que vendia flores se reconverteu e também já vende bandeiras), já está pendurada em quase todas as janelas e mesmo muitos carros não dispensam sua bandeirinha.
Claro que muito produto que se vê pendurado apenas tem semelhança com o original: os besantes (os círculos brancos dentro das quinas) se transformam em simples pontos ou em escudos ou, pasme-se, em cruzes! E até os castelos (que são sete e se assemelham às torres de um jogo de xadrez) vão tendo suas formas mais ou menos estilizadas, chegando à forma de pagodes! Claro que aqui, o fato de 99% do produto ser fabricado na China talvez tenha a sua influência...
Mas vou explicar agora porque decidi escrever este texto: acho que a depressão, se não está acabando, está acalmando. Claro, se Portugal não ganhar essa copa, a ressaca vai ser grande. Mas aí, como disse de início, ainda temos Atenas. De início, estava achando que esse negócio de pendurar bandeirinha na janela era uma completa bobagem. Mas depois de ver uma, duas, dez, uma rua inteira, várias ruas, com bandeiras ao vento... achei bonito! E aí pensei: pô, está um primeiro-ministro, todo um governo, até o Presidente da República dizendo que isto está melhor e ninguém acredita (e quem acredita em conversa de político?). Chega um treinador de futebol, estrangeiro (oh, mas esta nossa língua comum ajuda tanto...), pedindo apoio à seleção de uma forma simples (uma simples bandeira) e, de repente, começamos a acreditar! Em quê? Que é possível! Que basta acreditar que é possível para que seja mesmo possível!!!
O futebol pode ser ilusão, mas sonhando...

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